[Análise] Concrete Genie: Vale a Pena?
Concrete Genie é simples, mas que conta uma história bem reflexiva. Belo visual, jogabilidade agradável e boa dublagem são destaques deste exclusivo de PS4.
“A arte existe para que a realidade não nos destrua”, disse Nietzsche. E a nudez escancarada dos fatos pode mesmo nos dilacerar por completo em circunstâncias quase incontroláveis. Talvez os desenvolvedores de Concrete Genie não tivessem a intenção de fazer do game uma representação da famosa frase do melancólico filósofo alemão, mas ele vai certeiro neste alvo.
Concrete Genie é simples. Não espere encontrar aqui uma colossal proposta tipo God of War, por exemplo. As suas expectativas devem ficar mais num nível entre Life is Strange e Gravity Rush 2. Jogos muito bons, mas que não receberam tantos holofotes. E isso não é, de forma alguma, um demérito.
Gráficos muito bonitos, jogabilidade fácil e prazerosa, excelente localização para o PT-BR e o enredo que faz refletir muito sobre questões que parecem fáceis, mas podem ser muito mais profundas. Concrete Genie reúne tudo isso e mais.
A arte imita a vida
O jogo narra a jornada de Ash, um adolescente que sofre com as constantes perseguições de outros de sua idade e tenta escapar dessa realidade fazendo desenhos em seu caderno.
Após uma das muitas brincadeiras de mau gosto dos Valentões, o garoto acaba descobrindo uma espécie de pincel mágico, capaz de dar vida a suas criações. Com ele, Ash pode usar a arte para reviver a decadente cidade de Denska com pinturas vivas, salvando-a da escuridão.
Parece uma história bem bobinha, mas ela é carregada de metáforas e questões complexas. No game, o menino costuma fazer rabiscos que se parecem com monstros – porém, com rostinhos amigáveis. Isso, na verdade, pode ser entendido como os seus problemas mais pessoais.
É algo como: cada um traz dentro de si um pouco de escuridão, angústias e questões mal resolvidas que nem todos conhecem. E enfrenta estas dificuldades à sua maneira. A do protagonista é desenhando.
Não só ele, os Valentões também, mesmo em um primeiro momento sendo os vilões, têm seus demônios internos. E é aqui que o game aborda de uma forma natural algo espinhoso como o Bullying, prática de atos violentos (físicos ou psicológicos), intencionais e repetidos contra pessoas mais fracas.
Ash é constantemente perseguido sem motivo. Eles tacam pedras, tomam seus pertences, fazem terror psicológico, agridem e outras coisas que, em um olhar mais superficial, podem até parecer “brincadeira de criança”, mas não são.
Aos poucos, o personagem descobre que, talvez, o motivo de tanta implicância pode ir além. Os outros também passaram por situações estressantes no passado, ficando desamparados em tempos de muita angústia. Há até momentos onde ele chega sente pena dos algozes.
É uma história bem envolvente. O único porém é que o jogo é bem curtinho, com apenas cerca de 6 horas de gameplay. Vale aqui o destaque para a localização brasileira. Mais uma ótima dublagem em um exclusivo do PlayStation 4, mesmo não sendo um título de grande orçamento.
Arte além da jogabilidade de Concrete Genie
É preciso usar um pincel mágico para pintar paredes e ir, aos poucos, removendo a escuridão de Denska através da arte. Cada página do caderno de desenhos encontrada adiciona novas pinturas. E é aí que o jogo ganha com cor.
Concrete Genie pega um pouquinho emprestado das mecânicas de LittleBigPlanet nos momentos de pintura. Você abre um menu, escolhe uma arte e usa o movimento do DualShock 4 para fazer os traços, e mesmo que você não tenha células de DNA de Pablo Picasso, vai sair algo bacana.
Há gramados, sol, nuvens, estrelas, borboletas, árvores e muita variação. Dá mesmo para criar algo especial. Ponto positivo para facilidade. Você não ficará, em nenhum momento, entediado. Há uma sensação de autoria, propriedade. É sua arte, ali, no jogo. E não é nem preciso ser um grande artistas para tal.
Essa é uma parte da mecânica. A segunda é a criação de Gênios. Ash consegue dar vida às criaturas do caderno nas paredes. Abra o menu, selecione um corpo, cabeça, cauda, outros e adereços e voilà. Um criaturinha bizarra acaba de ganhar vida, literalmente.
Seu Gênio é quase como um tamagotchi. Você vai precisar interagir em diversos momentos. E como emocionante ver a conexão acontecer. Ele pode sentir frio e precisar duma fogueira, fome e sonhar com uma maça ou até uma borboleta para brincar. Em troca, vai te ajudar a transpor obstáculos de variadas formas.
Os com propriedades de fogo queimam tábuas, os elétricos acionam chaves, de ar sopram plataformas, etc. Você só vai precisar criar conexões (pintar regiões) para que eles cheguem até onde se deseja. E é exatamente aí que se encontram os quebra-cabeças. É preciso levá-los até determinadas partes, para que eles possam ajudar na solução de algum problema.
Mas Concrete Genie carece um pouco de desafios. Os puzzles são fáceis e não há inimigos na maior parte da jornada. O único contra-tempo são os Valentões. A trupe fica em áreas onde você precisa pintar, só que é fácil despistá-los. Basta causar uma pequena distração e, pronto, o local fica livre.
E se porventura você for pego, no máximo terá que recuperar seu pincel mágico. Batalhas mesmo só acontecem perto do fim, quando Ash tem de enfrentar “demônios da escuridão” com ataques de tintas. São confrontos muito legais que até contam com outras habilidades. Só uma pena que eles aconteçam quando a narrativa já se encaminha para os finalmente.
A arte diz o indizível; exprime o inexprimível, traduz o intraduzível
Ainda que curto, Concrete Genie conta sua bela história de forma surpreendente. É intenso, vivido e reflexivo. Um game que nos proporciona um uma experiência agradável, daquelas que vale a pena ser experimentada.
Não é blockbuster, mas ainda assim conta com um visual muito bonito – principalmente na hora de criar as obras de arte – jogabilidade fácil que aproveita o sensor de movimentos do DualShock 4 e vem com uma localização brasileira de qualidade.
Claro que quando você olha para o calendário e enxerga nomes como: Call of Duty: Modern Warfare, Death Stranding e Star Wars JEDI: Fallen Order pode até pensar em colocar o game da PixelOpus para escanteio, mas deixará de experimentar uma obra bem significativa.
Por que não se permitir?
Fonte: Voxel