[Aviso: spoilers abaixo!]
Em The House of Black and White (S05E02), quando resolveu revelar a Daenerys (Emilia Clarke) que as histórias tenebrosas a respeito do velho Aerys Targaryen não eram apenas intriga dos opositores, sor Barristan (Ian McElhinney) contou: “Seu pai incendiou as cidades. Assassinou filhos na frente dos pais. Queimou homens com fogovivo, rindo enquanto gritavam. (…) O Rei Louco deu a seus inimigos a justiça que ele achava que mereciam, o que fez com que se sentisse mais poderoso e correto a cada vez, até o fim”. A partir daí, embora tenha lutado para provar que não herdou o temperamento do pai, a Nascida da Tormenta repetidas vezes agiu de modo autoritário, inflexível e até assustador.
Assim, o caminho que os showrunners David Benioff e D. B. Weiss decidiram trilhar em The Bells, penúltimo episódio de Game of Thrones, é, sem dúvida, polêmico, mas não pode ser considerado inesperado. Além de ser tópico recorrente na Antiguidade Clássica — o personagem cujas ações acabam o conduzindo ao destino que ele tenta evitar —, essa escolha se fundamenta pela força dos subtemas que traz consigo (como a ideia de que, muitas vezes, o líder que pretende livrar seu povo de um tirano apenas se torna um novo tirano) e pelo potencial dramático do conflito que se configura entre Dany e outros personagens centrais. O grande problema é o modo como a narrativa foi construída.
A oitava temporada estabeleceu algumas condições para a reviravolta da protagonista, como a dor pela perda de mais um dragão e de seus dois amigos mais próximos, sor Jorah (Iain Glen) e Missandei (Nathalie Emmanuel); a frustração por ter sido recebida em Westeros com desconfiança e antagonismo; a crença de que foi traída por seus principais conselheiros, Tyrion (Peter Dinklage) e Varys (Conleth Hill), e por Jon (Kit Harington), o homem que ama; e, especialmente, a descoberta de que há outra reivindicação mais forte ao Trono de Ferro, que sempre acreditou ser seu por direito.
Por outro lado, os criadores aparentemente ignoraram toda a complexidade da khaleesi, que GoT passou anos construindo — ela é movida tanto por fúria quanto por compaixão e pelo sincero desejo de fazer do mundo um lugar melhor. Ou seja, mesmo diante de todas as adversidades mencionadas no parágrafo anterior, somente um acontecimento muito grave poderia justificar a decisão de Daenerys de aniquilar a capital após ouvir os sinos anunciando a rendição e, com isso, matar incontáveis inocentes. Do modo como foi apresentada, a resposta pareceu abrupta, desproporcional e incompatível com o perfil da personagem, que não à toa ostenta mhysa (ou “mãe”) como um de seus epítetos.
O roteiro de Benioff e Weiss foi igualmente injusto com Jaime (Nikolaj Coster-Waldau). Todo seu arco de redenção, bem como o relacionamento com Brienne (Gwendoline Christie), ambos cuidadosamente desenvolvidos desde a terceira temporada, foram jogados no lixo sem qualquer cerimônia. Também neste caso, a mudança de disposição do regicida, que em um par de cenas estava novamente à mercê da irmã, foi repentina e inconsistente. De quebra, a retomada do amor incestuoso resultou naquele que talvez seja o maior anticlímax da série: a morte de Cersei (Lena Headey).
Apesar disso, o episódio teve alguns bons momentos, como a inesperada demonstração de afeto de Tyrion e Varys, o último abraço do anão e Jaime e a despedida de Arya (Maisie Williams) e o Cão (Rory McCann) — foi tocante o modo como ela finalmente o chamou pelo primeiro nome. Aliás, o tão antecipado confronto entre os irmãos Clegane foi bastante satisfatório, com toda a brutalidade que se esperava e o único desfecho possível. Mais uma vez, o diretor Miguel Sapochnik demonstrou competência, não só nessa como em outras sequências de ação.
Resta saber quais serão as consequências do violento ataque de Dany. O que Jon e Tyrion farão a respeito? E quanto a Sansa (Sophie Turner) e Bran (Isaac Hempstead Wright)? As Ilhas de Ferro e os demais reinos ainda terão algum papel na história? Bronn (Jerome Flynn) virá cobrar a promessa feita pelo Lannister? Considerando o destaque dado à reação de Arya ao massacre em Porto Real, será que ela vai mais uma vez colocar em prática suas habilidades como assassina?
Que venha o último!
Fonte: Jovem Nerd